segunda-feira, 2 de outubro de 2023

 

Javali, javari, jauari

 

Estava eu dentro daquela construção onde passei a infância no sertão, usina velha, lidava com algodão... Entre destroços, alvenaria antiga e uma selva erguida. De repente surge um javali grande, destes mágicos que falam e a gente entende. E depois de dizer uma porção de coisas sérias sobre vida, corpo, território, presença, destino; me desafiou na força.  Olhou fixamente e veio até mim em carreira, abocanhou-me a orelha esquerda, babando os cabelos. E sabendo eu que era necessário estar imóvel, com perigo de partes contidas na boca do bicho, mágico, que me ensinava algo. Algo de sobrevivência e luta, e algo além. Algo sagrado, porem palpável, talvez não capaz de segurar. Algo vermelho terra, como um sopro quente além da raiz; algo ancestral da feitura das gentes de carne, essas que passamos a ser, e ao pouco também fomos esquecendo que somos.

Encontrei um rio e uma luta de cá, e um milagre na Índia. Aos poucos vou desvendando os símbolos que despertam quando durmo, que dormem quando desperto, que despertam.

Na casa de vó Regina, um portal, e vozes que aconteciam, vozes de bruxas antigas, como num rádio antigo pegando frequências mortas. - Não as escute, melhor você não fazer o que elas querem – eu temia esse desconhecido feminino que não podia ver ou ouvir, mais do que temia o Javali que me atacava.

Em outro ambiente grandes torres vazadas, pálidas, piramidais. Danças modernas, hipnóticas, vampirescas. Quis sair daquele lugar. Descia rapidamente as galerias, brancas, pálidas. Algo mediterrâneo. Aldo desértico. Propaganda de malboro. Pessoas alienadas, ou apenas festivas. Elas não sabem que logo serão mordidas, sugadas... tudo muito perigoso nessa região da mente do Arizona, Novo México, ou sertão.

sexta-feira, 10 de março de 2023

E de repente, mais que de repente
Uma gama de bundas na tela
E ora é por liberdade
Ora a liberdade encerra
Perfis guiados pelo gosto macho
Uma pós pornografia
O cotidiano expandido é tão pequeno
Cabe na palma da mão
Numa subvida, tela
Corpos isso
Corpos aquilo
Que corpo cabe ou não
A mulher assim assada
A assada, e sim, assim
O que cabe de repente
E de repente todes assim
Sensualizandi 
Vendendi 
Na lingua do jobs 
Me curte, me segue,
Não me julga
Me come, me bebe, me expurga
Tudo isso pela tela...
Vulva livre
Ventre livre
Guenga Power
Bundas muitas que se movem
Que se espalhem...
Umas tem cara, outras não
Umas tem cílios postiços
Outras na make padrão
Uma a vibe natural
"Sem filtro" é a descrição 
Umas muitus seguidores
Outras nem tanto, perdão
Umas de Yoga, de Yone,
Outras vão dançando bem
Umas cantigas bem toscas
Outras com música zen
Boom expressivo de bumdas
Fotos de bustos, de pélvis 
De barriguinhas "saradas"
Dançando hula com o Elvis
Quase todas no padrão 
Ratas de academia
Ou esportistas então 
Fotos de pratos tão fitnes
Nada pode a contramão 
Ou mostrar o que desejam 
Ou afrontar o refrão
Polifonia, será?
Tudo explícito, será?
Tanto não dito a falar
Tanta verve pelo chão
Entre a tese e antítese...
Terá síntese, ou não?...
Tanta gente triste à p0rr4
Mas vamos conectar
Fazer a foto mais top
Fazer a cara mais sexy
Fazer a dança da vez
Bora simbora expressar
Fazer o verso não dito
Dizer o que já tá dito
Se repetir outra vez
Chegou a hora e a vez
E a gente fora da caixa
Dizendo pro telefone
Tentando a rima que encaixa
Na força que nos socorre 
E já não é telefone
Inovação que incorre
Outra tecnologia
N"algo que é quase o mesmo
Mas sempre um algo "Algo mais"
Pra sobrepor o modelo
Que tanto tanto quis tê-lo
Mas que logo obsoleto 
Ultrapassou, jaz e trás 
Quem dá mais, é quem dá mais
E logo vem outrx top
E suplanta tudo tudo
Pra breve ser suplantado
Artifícios descartáveis 
Tão necessários agora
Quem não tem 
Nem gente é












terça-feira, 21 de fevereiro de 2023

cinza

Cinzas também revivem
É estranho, mas acontece...
Na força das alegorias
Na fé do ressuscitado 
Nas vozes ancestrais

Cinzas nas nuvens
Renascendo verdes solos
Cinza do cimento
Que a gente quebra
Colore
A cinza da brasa
Que assou o milho
Que esquentou o corpo

Mistério dos olhos cinzas
Cinzelando o tempo
Que por trás dos olhos
Mar cinzel de desmemórias 

Cinza a ave, a mãe das aves
A harpia dos ares
Do tamanho da nuvem
Sombreando cinza
O sopro do bote

A coruja cinza
Amiga dos sinos
Numa tarde cinza
De Egito 

Entre os palmaeirais 
Sob um sarcófago
A cinzenta pele
Da múmia 

Cinza, cinza, cinza
Como a brisa em breve
Ou vento de chuva
Cinza que lhe rege